sexta-feira, janeiro 30, 2015

Estige

Enrolou um cigarro, parecia distante, pensativa, toda ela fachada, intelectual, meio tomada ao café, debruçada sobre um jornal. Simplesmente verdadeira.
Acendeu o cigarro, certa de si, altiva.
Por meio de um café, acendeu um cigarro, puxou fogo, fez fumo em garganta, toda ela passava, por entre as discretas passagens, sem que nada nem ninguém se apercebe-se, tombos e voltas, nada de verdade.
Figura serena, não descrita em parte alguma.
Caminhou, o seu vestido esvoaçava, qual chuva miúda, enrolada ao vento, tal era assim solta mas sincera ao olho, deslumbrante num caminhar.
Passava pela gente, poderia não querer, ficava marcada no olhar, toda ela, tolda atenção que despreza, na verdade, não é a sua obsessão.
Sai pela rua, vai valente, nela só solta ao vento, velada do que traz na alma é única observante, de um caminhar descompassado.
Não traz folha solta, olhar seguro, peito ardente, não é por verdade/amargura, objecto de mente demente.
Acendeu um cigarro, avançou na sua leitura.
Uma página passou a frente, sorriso solto, expressão madura.
Olhou para a escritura, palavras tontas de pasquim informativo.
Mais uma vez um aceno de repúdio expressão honesta, na verdade não é desprezo mas sim indignação em festa.
Puxou de novo o cigarro, deu mais uma baforada.
Sentiu o deleito do fogo ardente em pulmões de fogo e âmbar.
O vento que lhe passou, tocou-lhe o cabelo, fez dele juba solta em savana selvagem, nem se importou com o resultado, um toque de mão, acalmou a aragem.
Negação ante negação inspiração em expiração, reconhecimento de tudo ou não…
Apagou o cigarro, levantou-se e pagou.
Extinta ficou a vida.
Diz-me o seu nome, ás de o saber de antemão.

terça-feira, janeiro 27, 2015

Ao sinal, desafio e pena rasgada

Ao sinal que trago, carrego essa emoção, num quarto pequeno rasgado, estas paredes são de ilusão.
Na verdade, é um sufoco, nem por clamor, ardor ou explicação.
Hora, ora, venha a sedução, a noite que encanta, trás em si recordação…
Lince, tigre pingado, figura felina que praga o coração, não o que te mexe, na verdade é um apelo à obrigação.
A recordação, parte então desse desejo, a vontade é de partir, a guerra se foi tida, foi por batalha em que derrotaste tudo o que poderiam deitar, engenhos de mundos aparte, apenas por uma noite, mais ou menos ilusão.
A teia de areia, passa então o mundo e as aranhas fazem gestos na areia, não sei, se me entendes nesse nexo, mas estende-me um abraço, não faz frio mas parece.
Desafio é o que parece, na verdade é perdido por não ser tomado e não faz um abono, ode a nada, apela a uma noite tranquila e um sonho passageiro, crer em nada, desenhar e desdenhar o mundo, se não é credo é crença estúpida, abismal ignorância.
E não eu não sei.
O pensamento que me corre, escorre pelo mundo, partir é um sentido, quando partido está tudo, cacos que podemos elevar.
Podemos então prostrar, fazendo contas ao prestado, não servimos então no semblante, brincos-de-princesa, ornatos de melancolia.
A pena, foi então rasgada, porque escreveu o mundo e voo em penas soltas, assas distendidas, eleição predilecta do mais fervoroso poeta.
Na verdade voa com o tunante, não deseja um destino certo.
Em feito, clamoroso, ferve de ilusão e se por si se preta, perde por um segundo a festa, num mundo perdido, não presta.
Creio tornar ao tomar de levante, não por sentido e sim por ordem, toma nota, não há sentido.
E raio por quem sente, na verdade é o abandono…
Deixo por despojo, guerra feita…
E se na verdade foi tomada, deito-me em leito alheio.
À calma que se me afronta, desespero terreno…
Deixa ao clamor, um desejo eterno porque eu simplesmente não sei.
Não tenho ideia…
E por consequência, trago vela ao peito…

segunda-feira, janeiro 19, 2015

Habitante

A porta está aberta, mas ninguém sai ou entra.
A entrada jamais foi negada, aberta tida a olhos fechados, invisível, dissociável deste lugar, jamais fechada, sempre pronta no entanto ninguém a sabe cruzar.
A porta está aberta, portão seguro, visível ao fundo, não confundível com nada, certo directo e seguro, portadas maiores não poderão existir.
No entanto é porta oculta, presente aos olhares do mundo, que por puro infortúnio, meio mundo não sabe transgredir.
A porta está aberta, para todos os efeitos, são olhos satisfeitos, que para ela olham, se a tem como certa, a porta segue aberta, só não cruzada por pernas, que não a sabem passar.
A janela ficou fechada e nessas tristes arcadas, chora a chuva dos dias, primaveras e outonos, ondas sazonais tempos que passam por elas e elas permanecem inertes, sempre assim, sempre presentes.
A porta está aberta, o seu significado é correcto, ninguém olha para ela de outra forma, não por desejo ou norma na verdade é perfeita e todos tem medo dela.
A entrada fica ao fundo, não está velada do mundo, cruel não é por certo, podes também aproximar-te dela, com certeza atravessa-la passar além dessas muralhas, ficar presente nela, passar, essas arcadas.
A porta está aberta.
Sabes o significado dessa promessa?
A porta está aberta, nesta casa com janelas, onde as paredes eram belas, corroídas pelo tempo, jazem no chão, singelas, que foi tempo delas, fortes, belas, agora ruínas, quebradiças carregam as tristes janelas, onde os olhares ficam partidos, onde os vidros partiram e onde a chuva sempre bate.
A porta esteve aberta, foi casa, foi morada, foi de tão calorosa fachada, que agora por estupidez e estupro perdeu dita razão.
A porta continua aberta, para uma casa vazia…
Ninguém quer cruzar fria porta, ninguém habita uma casa vazia…
A porta ficou aberta.
A vida continuou a passar.
A porta abandonada, espera pelo teu toque, sabe sempre que é o teu lugar, não por razão de morada, código postal que te sustenha, ficou com paredes quebradas, vidraças despedaçadas, no seu lugar criou vazio, no vigor cinzenta demora e assim por violência não tomada, foi-se abaixo, esta casa presente.
A porta, está aberta, continua aberta nesse lugar, tão só foi transgredida e quem vivia, deixou de morar.

domingo, janeiro 18, 2015

Dicotomia de Sonho

Acordar por acordar, nem sei se hei-de estar acordado.
Nem por hora de penumbra, mal tida em hora de loucura, a hora passa, o sonho volve o sono não vem, a hora morre.
Acordar, nem sei se acordei, de facto não faz a falta, revolto num canto, coberto para a vida, acordar, acordado, adormecido certamente.
Faço jus a hora, não é realmente um desafio, permanecer assim acordado, nem distante nem presente, nem sabendo bem enfim…
Acordar, dita maleita, preferiria continuar adormecido, por desenho de fisionomia molesta e economia funesta, vem o acordar o labutar benigno.
Acordar para a loucura, deixar-se desperta nela, não fazer do movimento um novelo, desenhar o acordar, presa mão em silêncio, cruel se tem assim ao clamor.
Acordar em vaga hora, sentido de nada por tudo, ora olhar para o vazio, sentir as sombras do escuro.
Acordar não toma a medida, nem sei se acordado é um acordo mas na certeza do incerto, sempre longe, puro estropio.
Acordar de meia maleita, sem seguro de vida, acordo adormece o homem e segue adormecido o governante.
Acordado, sempre é o caminho, não é por acordar ao raiar da lua, adormecer ao quebrar do dia e sonhar consoante a dissonância, não é de facto via ou vida.
Acordar, estar desperto, passar a vida qual morto vivo, fazer a função ditada, sem espaço para erro ou mora vira.
Acordar, ancorar a vida, não é mais a regalia, se não há valor que seja pago, vazios bolsos, cabeças cheias, mãos vazias e feridas frias.
Acordar, não deixa ao sonhador o sonho, o sonho anda vazio, na verdade é uma ilusão, o sol brilha, o corpo anda, a casca move mas vai vazia.
Adormecer treme o semblante ora por meia vida, clama ao longe um sonho distante, olhos abertos, abraços ternos, comover assim a criança eterna.
Acordar, adormecer, sonhar, talvez voar, não é uma realidade que exista, salvo de cabeças loucas, pessoas tranquilas.
Acordar então, passa por ser um terror, quando na verdade, nunca somos tranquilos.
Acordados, vivemos presos, seguindo o rasto do acabamento e fazemos esse trajecto diário, não creio palavras para descrição conhecida.
Adormecer, acordar…
Vida cinzenta, vazia.
Acordar, adormecer…
Sonhar com nada, alma fria.

sexta-feira, janeiro 02, 2015

Um beijo e um adeus

Às palavras marcadas em benemérita expressão de entrelaçado pensamento, se nos deixamos tocar por elas, somos como sentimos, soldados soltos deixados ao vento…
Damos a escolha, foi nos dada por alguém, é um poder infinito e estranho, usado com atenção demais para um ser, é o sentido desconexo, vexada altura e estúpido saber.
Desconecto.
Nem sei neste momento saber ligações, não me apraz, sentido de loucura, forma ou orientação, se assim no meio de tudo, silêncio é o sentido, deixo ao som do volume, hora e juízo.
Saber passar é uma vitória e em vitórias vivemos memórias, sempre ligamos ao sujeito, o tempo parte, faz parte do nosso trejeito.
Obrigação, talvez não a sinta, não sei se é por isso, preso ou não pela emoção, deixa as portas abertas, que se descarregue sobre o mundo, essa sóbria sensação.
Sabes, não é por um momento que vivemos senão por aquele momento exacto, em que tudo se torna claro e desse momento passado tudo rui, tudo se desmorona e por estupidez de negligência, orientação perdida, o meu desejo é recordar o passado, trocar viva memória, apagar as feridas.
A sensação sempre foi essa, sentir-se incapaz, somos levados a loucura pelos versos escritos, tudo o que ficou para trás.
Como podemos compreender o passado, se o passado se fecha sem mais?
Não, de facto não há nada mais cruel que uma memória.
Mas se me permitem esta verdade, antes ter uma memória que não ter nada e vaguear nu por aí.
Órfão de saber, asno de memória.
Então aspiro ao reboliço, coisas doces e sentidos alegres, nunca os passos por folhas, palavras ou versos.
São contradições de mim, minhas palavras, actos de loucura.
Se faço gesto, imprimo nele o que sou, sem jogos ou tramóias.
E para palavras vazias, vozes que se ergam, que transitem que as transmite ao vazio, merecem o silêncio do jazigo.
Para mim, sobra-me memória, um beijo e um adeus.
Sentido de permanecer por fora, por favor, uma memória.
Na verdade, não é o amargo que te mata, senão o mais doce veneno…