sexta-feira, janeiro 26, 2018

Coisas terríveis

Pedaços de mim, que vou escorrendo pela parede, parece ser o desafio mais recorrente, conforme me dá por ser, por me fazer ou existir, como se assim me aparece a vontade, assim me projecto de novo a parede.
Expressões de exaustão, ao sentido, a verdade, a voz que incessantemente grita, a vontade de carregar, para fora de mim o que trago, não é subjacente a minha tendência de crescer, não é adjacente a minha expressão, não sei bem.
Conforme vou falando, vou-me perdendo, de pertença de realidade, como se faz assim a minha expressão, nem sei, nem recordo, mas como vou eu fazer, para poder falar, sem que possa contar, sem que possa libertar as coisas que trago em mim.
E é assim que se consome o que devo dizer, mais um pedaço cancerígeno, mais uma purga dentro de mim, mais uma pequena dormência que se me assola na alma.
Vou pedindo, de dentro de mim, a minha voz que ignoro, por preferência de existência, por proximidade que desejo manter, sem que saiba realmente como me interpretar a mim mesmo, de novo no colete-de-forças, caminho à forca, a expressão está perdida.
Mais uma vez calado, mais uma vez atado a cadeira de existência, mais uma vez abalado de dentro para fora, sem que o de dentro se possa exprimir, mais uma opressão que me faço, mais uma pequena batalha, como sempre, vai larga a guerra.
Como procuro então esse botão de desligar, de permanecer impávido e sereno, de transmitir calma e segurança. Activado.
Face á face com a dormência mais uma vez, como vai ser esse momento, como não fazer o que gostava?
Activado e desligado, eternamente desconectado e desconcertado.
E então, essa coisa terrível que me faz querer fugir de novo, luto, contínuo em frente, nem me deixo parar, paro a minha condescendência e a minha obsolescência, para continuar em movimento, para permanecer este ciclo, seja fulcral ou não.
Permaneço.
Sem muito para espiar, calei-me de novo e voltei a arrumar no fundo de mim o que poderia sair. Ainda existe, ainda assim.
Silêncio.
Não me permitem revelar, não me permite vaiar.
Não me cabe a mim pois quando coube, não me soube expressar.
O silêncio é meu. É o meu mérito, é a minha tortura.
Triste condenação.
Apenas mais pedaços de mim.

segunda-feira, janeiro 22, 2018

Tanto

Tão mau que seja sozinha, a vontade de voar que me nivela à horizonte de um sonho singular.

Tão simples que seja a verdade, de um abraço que possa ter, sempre que em viva saudade tão só me posso ter.

Tão verdadeiro que passe o tempo como é ordinário falar, de entre portas para fora, sempre que alguém se vire, alguém há-de julgar.

Tão simples que haja tudo, na verdade é nada. O objecto taciturno que vê e cala mude o vulgar gesto de mudar.

Tão pequeno e rápido é o tempo, que nos deixa próximos assim como a eternidade que nos separa quando apenas passa um segundo longe de ti.

Tão inquietante o texto que se faz passar, nas mãos de quem não se vem, de quem se aproxima a distante.

Tão obscuro o silêncio que deixo passar, a voz alta à que te grito incessantemente e parece muda por falar.

Tão incoerente aquilo que digo, pois certamente da minha mente para fora, talvez não deva passar.

Tão perfeito, tão obtusamente feito e desfeito, entre gotas de água se faz esquivar, sem vista do que é ver e passa pelo seu entremear.

Tão tolo. Tão monstruosamente tolo. Tão monumentalmente tolo. De todo certamente tolo.

Tão incerto. Como explicar o que deveria ser falado da boca para fora, de boa vontade, de boa verdade, de curta versão para extensa tradução?

Tão certamente e deliberadamente lixado.

Tão estupidamente emocional, que me tira de mim mesmo que me faz querer falar, gritar, berrar, pontapear, atacar de punho uma parede até me desfazer nela e cair com ela.

Tão… Então...?

Aqui é a tua parte.

quarta-feira, janeiro 17, 2018

Sonho que vai e vem

Hoje não me deitei.
Não me veio o sono.
Procurei por ele por dentro de mim, abrindo todas as portas entre abertas.
Sem que em nenhuma tivesse a sorte de o encontrar.
Em todas elas, não obstante, fui encontrando pedaços de ti.
Continuei a abrir portas, parecia uma corrente a passar, qual mar adentro me queria puxar, cada vez mais se enchia a cabeça desse teu ar.

Hoje não dormi.
Não sei se sei o que é dormir, apenas me arrasto na cama, rodando de lado a lado, tentando saber um sítio para aninhar mas é tudo alienígena.
Continuei a procurar então neste sítio inóspito disposição para me julgar, um sítio por onde pernoitar e sem me dar conta, estava já um pouco mais fora do meu lar.

Hoje não me encontrei.
Por mais que procurasse, por mais que indagasse por aí, parecia não fugir de uma sombra.
Sem me aperceber olhei, uma sombra de ti. Fez-se-me branca a tez.

Hoje perdi o meu norte.
Sem um rumo, lá continuo eu perdido e taciturno.
Silencioso e indigesto, relevado a insignificância e ao mais severo desterro.
Coisas enfim, bastante singulares e um tanto mundanais.

Hoje não sei da minha sorte.
Não sei de essa pata de coelho.
Não sei de esse trevo quadrifendido.
Não sei de esse número mágico para colmatar a má vertente.

Hoje lá me deitei.
E sinceramente, nem sei se dormia.
E honestamente, não passava de meia vida.
E por fim, tentei fechar as portas, deixar dentro os pedaços de ti.

Hoje adormeci.
Entorpecido. Desagarrado. Silencioso.
Continuei sem me encontrar, continuei sem rumo. Continuei contigo no olhar.

quarta-feira, janeiro 03, 2018

À memória

Acendo memórias, qual cigarros queimados, pedaços de papel que vou largando ao fogo.
Passa-me ao lado, sei me certeza perdido, sei que a estrada a tomar é sempre em frente, haja ou não curvas pelo caminho mas a minha paragem, mais que certa parece ter-se perdido e cada passar do pneus arrasta apenas a saudade.
Libera-me de este tempo, a incerteza que me vai deixando atado, consoante vou velando a vontade, sempre que possa explicar a minha mente, na verdade, cada vez que tento mais me perco nela, construo apenas a minha ansiedade.
Como me revejo em mim?
Já pouco sei, desde que me perdi, sem me achar, vou viajando por aí, na constante incerteza de esperar talvez encontrar, num sítio talvez abandonado em mim, um pouco mais de ti, que espero tão só conseguir compreender.
Mas falha-me o olhar, falta-me a intuição, falta-me compreender ou perceber toda a sinalética, sigo em frente, falho mais uma parada, forçado, lá paro em mim, para insistir um pouco mais sobre o que parece conduzir ao vazio, sem que possa explicar um pouco mais de mim, sem que possa falar e que possa revelar o que o meu cárcere me apresenta.
Olho pela escuridão, tão longe quanto o meu olhar me permite, sem me aperceber, apetece-me de novo partir, ligo então a minha solidão e ela há de me levar por aí.
Arranco de novo, deixei mais um pouco de mim, certo que o vento me há-de levar, como me leva de ti, sei que é um pouco uma ambição, ou talvez uma pronta ilusão poder perceber, enfim, a sinalética desse teu lugar e poder parar por aí.
Deixo-me levar, tão só os quilómetros a passar, seja pela alegria de poder voar, olho o sem fim, percorro como posso o que me faz chegar, até ao horizonte, até me revelar, volto, eternamente a mim.
Mas dentro de mim, jaz já outrem, quem me dera poder olhar e perceber, como se foi fazendo entrar, não sei como o dizer, mas dentro deste eu que se faz de mim, pequeno e intensamente longínquo, existe sem dúvida, uma certa parte de mim, que se fez chegar por outra, que se fez aproximar, assim.
Deixo-me então a descrever o que me faz parar, o que me faz voar, o que me faz voltar a ti.
Deixo-me então calar, certo de que estas por aí.
Neste momento, tenho pressa de chegar, para partir por aí, sem que saiba se hei-de voltar, mas se voltar, gostava de dentro de fora, que fosse para ti.